Os descendentes de imigrantes geralmente têm muito orgulho de suas origens. Ainda que haja certo exagero no papel desse passado europeu (“sou estourado por causa do meu sangue italiano”, dizem alguns), é interessante ver como esses imigrantes pobres e rejeitados por sua pátria ajudaram a construir a sociedade brasileira ao lado de povos nativos e escravizados.
Em Legado Italiano, a diretora Márcia Monteiro mostra um pouco mais dessa comunidade de descendentes italianos no Brasil e, mais especificamente, na Serra Gaúcha. Ainda que seja um olhar bastante focado e particular, a cineasta consegue falar sobre vários assuntos que rodeiam a cultura italiana: o vinho, a religião, a lida com a terra, a música, relação com a família, etc.
É bonito ver esse resgate histórico, olhando para o passado com afeto e carinho, celebrando essas pessoas que lutaram para construir uma história. Eu, que sou bisneto de italianos, senti emoção ao ver pessoas com histórias tão semelhantes com a dos meus avós e bisavós — difícil não fazer paralelos, ver semelhanças e até similaridades na fala e no jeito de se expressar.
Uma pena, porém, que Legado Italiano fique tão restrito ao cenário gaúcho da imigração. Ainda que o Sul do país tenha recebido uma quantidade imensa de imigrantes, principalmente italianos e alemães, muitos europeus desceram em portos em São Paulo, Rio de Janeiro e em algumas cidades do Nordeste. Teria sido interessante explorar essas diferentes comunidades.
Da forma que ficou, fica uma sensação estranha, principalmente lá pelos 20 minutos finais, de que o filme era apenas um pretexto para falar das produtoras de vinho e espumante que existem na Serra Gaúcha. A Salton, uma das maiores marcas de vinho e espumante no Brasil, é uma das patrocinadoras do filme. Fica um gosto amargo de um propósito puramente comercial.
Dessa forma, Legado Italiano é um filme gostoso de assistir. Viajamos pela História, pensamos na nossa origem, nos nossos antepassados. Poderia ter sido um pouco mais ousado em sua criação e produção, indo além da comunidade gaúcha e em um formato narrativo, talvez, que explore melhor essa história — animações, por exemplo, seriam certeiras na recriação histórica.
Mas tudo bem. Ainda assim, é um filme que funciona dentro de um público específico, com ligações diretas com essa história de imigração. Filhos, netos e bisnetos dessas pessoas, que enfrentaram condições adversas, vão se emocionar e enxergar ali um pouco de si, ainda que numa cultura diluída e espalhada através das décadas que nos separam. Bonito e afetuoso.